O papel é preto mas a consciência é branca
Campanha de papel higiênico usa slogan do movimento negro e repercute nas redes sociais
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Escrito por Daniele Barros
A mais nova polêmica que surgiu neste meio de comunicação que tanto amamos e chamamos de internet foi em torno da nova campanha publicitária da empresa Personal que lançou um produto um tanto quanto curioso: o tal papel higiênico preto. Assim que a campanha estrelada pela atriz Marina Rui Barbosa foi ao ar, a empresa sofreu uma enxurrada de críticas e foi acusada de racismo. “Mas tudo isso somente pela cor do papel?” Não. Na verdade o problema está na hashtag e no slogan da campanha que utilizavam a frase “Black is Beautiful”.
Vamos explicar: Esta frase surgiu na década de 1960 nos Estados Unidos, época em que o país passava por uma grande segregação racial onde os negros não tinham os mesmos direitos civis que os brancos e a estética negra era vista com repulsa. A expressão “Black is Beautiful” foi então criada por militantes da causa negra da época para enaltecer a beleza negra e empoderar a existência no negro tão rechaçado por grande parte da sociedade americana. A frase se tornou uma palavra de ordem conhecida internacionalmente. Artistas como Nina Simone e nomes famosos como Malcom X e Angela Davis ficaram famosos por sua luta pela igualdade racial e juntos com a expressão “Black is Beautiful” foram protagonistas de diversos filmes e documentários.
Dito isto, dá para entender o porque da campanha da marca Personal ter sido tão criticada. É um tanto quanto absurdo fazer uso de uma expressão política tão importante para vender papel higiênico! Mas faremos o seguinte questionamento: Porque essa campanha foi aprovada? Será que nenhum dos publicitários da empresa responsável pela campanha tinha conhecimento histórico suficiente para deduzir que não ia dar certo, que seria ofensivo? Pois é, até nisso o fator social fala mais alto. Existem profissionais negros nas agências de publicidade? Existem, raros, pouquíssimos. A área de comunicação social ainda é elitizada e majoritariamente branca, porque, apesar de hoje haver iniciativas de inclusão de negros nas universidades, o racismo estrutural ainda é muito presente. A maioria da população afrodescendente é economicamente desfavorecida e não consegue chegar massivamente em um curso universitário. E os poucos profissionais negros que atuam no mercado nem sempre tem voz ativa. Logo, provavelmente, esta campanha foi feita por brancos, aprovadas por brancos que não necessitam compreender o contexto histórico do negro na sociedade pois não vivem essa realidade. E deu no que deu.
Imagem da campanha (Reprodução/Facebook)
E não, nós não estamos falando isso por mero achismo. Um estudo divulgado em 2015 pelo Instituto Ethos realizado nas 50 maiores agências de publicidade do Brasil, mostrou que a cada mil funcionários apenas 35 eram negros. A pesquisa mostrou ainda que apenas 0,74% dos afrodescendente ocupam cargos hierárquicos maiores. Outro dado relevante da pesquisa é que negros ocupam apenas 4,7% dos cargos gerenciais em levantamento feito em 500 das maiores empresas do Brasil.
Apesar do negro hoje ser mais lembrado pelas empresas, seja na hora de produzir produtos específicos para pele e cabelos crespos ou seja na atuação de negros em comerciais, quando nos deparamos com uma falha deste tamanho vemos que ainda falta muito para que uma posição de igualdade se torne realidade e que a realidade econômica e social da população negra influencia diretamente a questão da representatividade oferecida a população afrodescendente na mídia.
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